A professora, ensaísta, crítica literária e editora Nelly Novaes Coelho (17.5.1922 – 29.11.2017), nasceu no bairro paulistano do Braz, no emblemático ano de comemoração do centenário da Independência do Brasil e de eclosão de movimentos de renovação artística e cultural, cujo expoente foi a Semana de Arte Moderna de São Paulo. No coração da capital paulista, cresceu e se formou como se esperava das mulheres de acordo com padrões sociais e morais da primeira metade do século XX.
Desde a infância gostava de ler e escrever; foi estudante aplicada, cursou o ginasial em externato católico, aprendeu idiomas; estudou piano, foi aluna do escritor Mário de Andrade, almejava ser concertista famosa como Guiomar Novaes, prima do pai, obteve bolsa para continuar estudos na Itália, mas foi impossibilitada pelo agravamento da Segunda Guerra Mundial; trabalhou em agências bancárias e de publicidade; casou-se com um publicitário, tornou-se mãe e se dedicou aos afazeres domésticos e a costurar para familiares. Até que a mulher de 30 anos, inquieta e talentosa, sentindo que “faltava alguma coisa”, desafiou as expectativas e o “destino”, voltou a estudar, cursou o colegial e graduou-se em Letras pela Universidade de São Paulo – USP
Desde então, Nelly Novaes Coelho se dedicou incansavelmente a ensinar, pesquisar, escrever e publicar resultados de seus pioneiros estudos sobre diferentes vertentes da literatura. Em 1961, iniciou a carreira como professora universitária na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Marília/SP, lecionando Teoria Literária e Didática Especial da Língua Portuguesa, tendo também coordenado o projeto de criação do Departamento de Didática dessa instituição. Em 1965, ingressou como professora-assistente de Espanhol e de Língua Portuguesa na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, tendo se tornado professora titular em 1985. Atuou ainda como professora convidada em cursos de Literatura Portuguesa em universidades portuguesa e estadunidense, além de outras universidades brasileiras; criou a cadeira de Literatura Infantil no curso de Letras da USP, uma das metas do CELIJU – Centro de Literatura Infantil e Juvenil, de cuja fundação fez parte. Aposentou-se em 1992, mas continuou escrevendo, publicando e atuando como professora e orientadora convidada de cursos de pós-graduação e em ações de incentivo à criação de bibliotecas públicas na cidade de São Paulo, integrou a diretoria da União Brasileira de Escritores e presidiu a Associação Paulista de Críticos de Arte.
É autora de mais de 200 textos, entre livros, capítulos de livros, artigos em periódicos, resenhas e ensaios de crítica literária em jornais e revistas, destacando-se obras de fôlego invejável, como Dicionário Crítico da Literatura Infantil e Juvenil Brasileira e Dicionário crítico de escritoras brasileiras (1711 – 2001). Em reconhecimento por suas contribuições, foi agraciada com importantes prêmios e homenagens no Brasil e em Portugal.
O incontestável valor da atuação dessa prolífica mulher e intelectual brasileira e de sua obra para a história, teoria e crítica literárias – em especial seu pioneirismo no ensino e na pesquisa sobre literatura infantil e juvenil – são referências obrigatórias a todos os que se interessam pela expressão artística por meio da palavra e reconhecem seu valor humano e estético, imprescindível para a formação de leitores e para a conquista do direito de todos à literatura. Essa é a marca indelével do legado dos primeiros cem anos de Nelly Novaes Coelho.
Maria Mortatti – 16.02.2023