Professora, jornalista, escritora, primeira deputada estadual negra do País, a afro-catarinense Antonieta de Barros (11.07.1901 – 28.03.1952) é também a criadora do Dia do Professor e a primeira professora a ter o nome inscrito no "Livro de Aço", o Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, abrigado no Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves, em Brasília/DF.
Natural de Florianópolis/SC – antiga Desterro –, Antonieta de Barros era filha de Catarina de Barros, escrava liberta, lavadeira, e de Rodolfo José de Barros, provavelmente funcionário dos Correios, que morreu cedo. Começou a se interessar por aprender a ler e escrever no contato com estudantes para os quais a mãe alugava cômodos em sua casa, seguindo depois os estudos regulares em escola mantida por uma professora, e concluiu o primário e o ginasial em escola pública. Em 1921, formou-se professora primária pela Escola Normal Catarinense e passou a se dedicar, com sua irmã, Leonor, ao Curso de Alfabetização Antonieta de Barros, destinado à população carente, que funcionava em sua casa e contava com apoio do poder público. Lecionou também em escolas públicas e particulares e na Escola Normal Catarinense, além de ter sido diretora de escolas. Não pôde cursar Direito, como desejava, porque na época o curso era destinado apenas a homens. Em 1922, fundou e dirigiu o jornal A semana e a revista Vida Ilhoa, nos quais publicava crônicas – a maioria com o pseudônimo Maria da Ilha (referência à Ilha de Santa Catarina, onde nasceu), para se proteger das críticas masculinas –, com suas ideias sobre educação, política, emancipação da mulher e combate ao racismo. Estima-se que tenha publicado mais de mil artigos em vários periódicos, entre eles o jornal A República. Em 1925, participou da fundação da Liga do Magistério Catarinense. Em 1937, sob o pseudônimo Maria da Ilha, publicou o livro Farrapos de ideias, com reunião de suas crônicas e cuja venda reverteu em benefício da construção do Preventório, destinado a abrigar os filhos dos leprosos da Colônia Santa Tereza, em Florianópolis. Em 1934, concorreu a uma cadeira na Assembleia Legislativa do estado pelo Partido Liberal Catarinense, ficou como suplente e assumiu o cargo entre 1935 e 1937, tornando-se a primeira mulher negra no cargo de deputada estadual no legislativo catarinense e no País. Em 1935, foi a responsável pelos capítulos "Educação e Cultura" e "Funcionalismo público", da Constituição catarinense. Foi destituída do cargo pelo golpe de Getúlio Vargas, na década seguinte foi eleita deputada pelo Partido Social Democrático e foi autora da lei estadual n. 145, de 12.10.1948, que instituiu o Dia do Professor, em referência à promulgação da primeira lei educacional do Brasil, sancionada por D. Pedro I em 15.10.1827, que, entre outras medidas, criou as escolas de ensino primário público e gratuito. Em 1963, o Dia do Professor foi oficializado em nível nacional pelo Presidente da República João Goulart. Antonieta não se casou e não teve filhos. Aposentou-se como professora e diretora em 1951 e faleceu vítima de diabetes, aos 51 anos de idade.
Parte da memória documental de Antonieta de Barros está reunida no Museu da Universidade do Estado de Santa Catarina, que, após 70 anos de sua morte, concedeu-lhe o título de Doutora Honoris Causa (in memoriam). Sua obra e sua atuação vêm sendo estudadas e divulgadas em sites, séries de TV, documentário, artigos e livros. Também recebeu muitas homenagens. A mais recente é a inscrição de seu nome, por meio da Lei 14.518, de 04.01.2023, no “Livro de aço”, assim chamado porque suas páginas são feitas desse metal. Após aprovação pelo Congresso Nacional, o título é concedido a personalidades que tiveram papel fundamental na defesa ou na construção do País. Entre os homenageados até abril de 2023, estão 51 homens, como Tiradentes, D. Pedro II, Machado de Assis, Zumbi dos Palmares, e 13 mulheres: Anna Nery, Anita Garibaldi, Bárbara Pereira de Alencar, Clara Camarão, Jovita Feitosa, Maria Felipa de Oliveira, Maria Quitéria de Jesus Medeiros, Sóror Joana Angélica de Jesus, Dandara dos Palmares, Luiza Mahin, Zuzu Angel, Antonieta de Barros, Zilda Arns.
Antonieta de Barros – heroína da Pátria e uma das catarinenses mais importantes –, participou ativamente da vida política e cultural de sua época. Apesar das dificuldades que enfrentou e das duras críticas recebidas de homens, em um estado com população majoritariamente branca e conservadora, era admirada e respeitada pelo seu pioneirismo e enérgica defesa dos ideais de justiça social, dos direitos da população negra, da emancipação da mulher, da instrução e do livro como fatores de libertação e humanização. Assim ela deixa registrado em uma crônica do livro Farrapos de ideias: “A Escola, na sua função única, prepara as criaturas para a vida, – luta intensa e complexa. Os títulos podem envaidecer os nulos, os fátuos, mas não lhes permitem vencer. Só vencem os capazes. E a capacidade revela-se na ação. Só a instrução, só o livro, elevando o homem lhe dá o direito de ser homem; só a instrução consciente rouba as criaturas ao servilismo aviltante e procura alçá-las às cumiadas, onde o ar é puro e donde se descortinam todos os panoramas maravilhosos.”
Maria Mortatti – 31.05.2023