"Academia", do grego "akademia", designava o local onde, em 387 a.C., Platão inaugurou sua escola filosófica, mantida até 529 d.C., quando foi encerrada pelo imperador Justiniano, para acabar com a propagação da cultura helenística e pagã. Não se têm registros, com possíveis exceções, da existência de instituições desse tipo durante a Idade Média, mas, com o Humanismo, elas renasceram e com novo sentido: agremiação de intelectuais para debater assuntos filosóficos, científicos e literários de interesse comum ou homenagear figuras de destaque. As primeiras se organizaram no século XV, na Itália – com títulos pomposos ou irreverentes –, e a moda acadêmica foi seguida em outros países, como França, Espanha, Alemanha, Portugal, Inglaterra, Estados Unidos da América, tendo chegado ao Brasil no século XVIII. A Académie Française, oficializada em 1635 pelo Cardeal de Richelieu, primeiro-ministro de Luís XIII, e composta por 40 homens de letras – os “quarenta” e “imortais” – tornou-se modelar para muitas outras, como a Academia de Ciências de Lisboa, fundada em 1779, e a Academia Brasileira de Letras (ABL), fundada em 1897.
No século XVIII, no Brasil-Colônia, existiram várias agremiações literárias chamadas de “academias”, mas com características diversas, tanto como organizações com plano de trabalho e destinadas a durar, quanto como reuniões passageiras ou festividades pontuais com recitação de composições literárias originais. A primeira agremiação literária foi a Academia Brasílica do Esquecidos, fundada em 07.03.1724, na cidade de Salvador, Bahia – então capital da Colônia –, nos moldes da Academia Real da História Portuguesa (1720 – 1776), que aceitava membros de todas as outras colônias, exceto do Brasil. A dos Esquecidos foi então criada, a pedido do rei português D. João V, pelo Vice-Rei do Brasil, Vasco Fernandes César de Meneses, para reunir historiadores – nascidos aqui – responsáveis por estudar a história natural, militar, política e eclesiástica do Brasil, além do objetivo de estimular a produção poética de seus membros. Foi extinta em fevereiro de 1925, mas legou acervo considerável e obras importantes, como a História da América Portuguesa, do historiador e poeta Sebastião da Rocha Pita. Em junho de 1759, também na cidade de Salvador, com intenção de dar continuidade à Academia dos Esquecidos, o conselheiro do ultramar na Bahia, José Mascarenhas Pacheco Pereira Coelho Melo, fundou a Academia Brasílica dos Renascidos, com programação de obras de maior vulto e o objetivo de escrever a história universal, eclesiástica e secular, geográfica e natural, política e militar da América Portuguesa, tendo reunido, além dos 40 membros, grande número de letrados de várias partes do Brasil. Entre os seus principais nomes, está o cronista religioso Domingos do Loreto Couto, autor de Desagravos do Brasil e glórias de Pernambuco. A Academia dos Renascidos foi fechada em novembro daquele ano, quando seu fundador, que viera ao Brasil como administrador colonial e com a missão de expulsar os jesuítas, entre outras atividades, foi acusado de traição pelo Marquês de Pombal, que ordenou "sepultá-lo vivo", encarcerando-o junto com toda sua criadagem e livros na Fortaleza de Santa Cruz de Anhatomirim, em Santa Catarina, e, depois de 1774, na Fortaleza de São José da Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro, tendo permanecido preso por 17 anos e indultado por Dona Maria I, após a queda do Marquês de Pombal. Na cidade do Rio de Janeiro também se fundaram academias, para durar ou para celebrar. Em 06.05.1736, foi fundada a Academia dos Felizes, pelo governador Gomes Freire de Andrade, a qual durou até 1740 e publicou poucos trabalhos. E, em 1752, a Academia dos Seletos, que realizou apenas uma sessão, em 30 de janeiro daquele ano, em louvor de Gomes Freire de Andrade e produziu relatório volumoso publicado em Lisboa, em 1754, com o título de Júbilos da América. Outras academias foram fundadas no século XVII e, apesar da curta duração, compuseram um fenômeno cultural que marcou momentos importantes na vida pública e intelectual dos grandes centros da Colônia.
Nos séculos seguintes, outras agremiações similares foram fundadas. No Oitocentos, após a proclamação da Independência, pela relevância para aquele momento e pela permanência no tempo, destacam-se: o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, fundado no Rio de Janeiro em 1838 – ainda em funcionamento –, que tinha como uma das metas escrever a história do Brasil a fim de construir a identidade nacional e cujos sócios, caracterizando-se como historiadores, iniciaram produção historiográfica mais sistemática e metódica; e a Academia Cearense de Letras, fundada em 15.08.1894 (três anos antes da ABL), que é a mais antiga do Brasil ainda em funcionamento. No século XX, foram fundadas algumas importantes agremiações de escritores, destacando-se a Associação Brasileira de Escritores, fundada em 1942, com a proposta de regulamentar questões específicas do ofício de escritor, como a defesa de liberdade de expressão, do direito autoral, da isenção fiscal para livros, além de ser espaço de sociabilidade, de homenagens, premiações e publicações, entre outras atividades, e de que derivaram associações similares. Atualmente, no Brasil, além das canônicas, proliferam academias de escritores com tamanhos e características diversas, mas provavelmente com interesses comuns, sejam os de cunho corporativista, sejam os voltados à divulgação da produção literária, cada vez mais abundante. De alcance local, regional ou nacional, durando ou não, esse tipo de instituição milenar no Ocidente e tricentenária no Brasil parece ser, em si mesma, uma ideia perene, apesar de críticas, como a de serem apenas ou expressão de resistência de "renascidos", ou renovado modismo dos milhares de "esquecidos", ou persistente elitismo dos "felizes" e "seletos" "quarenta imortais", estes em constante tensão entre tradição e modernização, como exemplifica a eleição, apenas em 1977, de Rachel de Queiroz, a primeira escritora a integrar a ABL.
Maria Mortatti